Passos Coelho: um líder cercado...
13.12.2016 às 8h00
PÓS-PASSOS. Apesar de reeleito em abril com 95% dos votos dos militantes do PSD, Passos está a ser cada vez mais criticado
luís barra
Têm sido dias difíceis para Pedro Passos Coelho. Apesar da sua atitude impassível, de quem cumpre a sua agenda de “business as usual”, nas últimas semanas tornou-se evidente que o líder do PSD está cercado em várias frentes
Passaram apenas oito meses sobre o último congresso do PSD, mas já só se ouve falar do próximo – que, em circunstâncias normais, deveria realizar-se na primavera de 2018. Se a vida de um líder partidário na oposição não é fácil – António José Seguro que o diga –, a de um ex-primeiro-ministro na oposição é ainda mais complicada. Pedro Passos Coelho fez história (involuntariamente, é certo) ao vencer umas eleições e, no entanto, não conseguir formar Governo. Outro, no seu lugar, talvez tivesse atirado a toalha ao chão. Ele, baralhando os planos de quem estaria a fazer essas contas à vida, escolheu ficar.
E até foi reeleito (em março), com 95% dos votos dos militantes. Mas, um ano depois das legislativas, e com a ‘geringonça’ em velocidade de cruzeiro, começa a ser cada vez mais evidente a falta de paciência de alguns para a “cepa torta” em que o PSD de Passos parece “atascado”.
… pelo PSD
Vá somando: Rui Rio, Paulo Rangel, Luís Montenegro, Aguiar-Branco, Pedro Santana Lopes, Marques Mendes… E vão seis nomes que têm sido veiculados na imprensa, e correm nos ‘mentideros’ do PSD como podendo suceder a Pedro Passos Coelho. Antes dos nomes, que nesta fase misturam indícios concretos com uma boa dose de especulação, vale a pena atentar no facto: a sucessão de Passos Coelho já está na ordem do dia no PSD. Ainda esta segunda-feira, no i, o antigo líder parlamentar Guilherme Silva ensaiava uma espécie de guia de marcha: “Se for necessário mudar de líder, lá terá de acontecer”.
A questão não é se, é quando: nas autárquicas ou só depois das legislativas? Rio abriu a Caixa de Pandora, assumindo a divergência com a forma como Passos tem dirigido o partido e criticando a ausência de uma mensagem mobilizadora. E marcou o embate para o próximo congresso, agendado para março de 2018: nessa altura, já conhecidos os resultados das autárquicas e decorrida mais de metade da legislatura, o ex-autarca do Porto admite medir forças com o ex-primeiro-ministro. Se não for a jogo, outros o poderão fazer: Paulo Rangel e José Pedro Aguiar-Branco, os adversários de Passos nas diretas em que este foi eleito, em 2010, estão atentos e marcam terreno.
No caso de Passos Coelho sair por si – seja depois das autárquicas, seja depois de uma derrota contra António Costa – o leque de hipóteses é mais amplo. O líder parlamentar, Luís Montenegro, nunca disputará o cargo ao atual presidente do PSD, mas está a fazer o tirocínio para quando Passos sair de cena e tem apoios de peso – Miguel Relvas e Marques Mendes. E Nuno Morais Sarmento veio há dias lembrar que os dois ex-líderes do PSD ainda no ativo podem ter a tentação de voltar ao lugar onde (não) foram felizes: Pedro Santana Lopes e Marques Mendes. Enquanto Mendes nega com todas as forças que tem ideia lhe possa passar pela cabeça, Santana tem a cautela de político que quer e já passou por muito. “não está nos meus planos”, respondeu em entrevista, ao Expresso, quando questionado sobre voltar à chefia do PSD. Mas acrescentou: “Já sei o suficiente da vida para não dizer que isso nunca acontecerá de certeza”.
… pelas autárquicas
Foi Passos Coelho quem colocou a fasquia pela qual se medirá o sucesso ou insucesso do PSD na noite das eleições locais: ter mais câmaras do que o PS. Na prática, isto significa recuperar da hecatombe de 2013, quando o PS conquistou 150 autarquias e o PSD se ficou pelas 106. Na prática, o PSD sabe que isto não vai acontecer. Seria sempre difícil, mas a forma como a direção do partido está a gerir o processo, sem meter a mão na massa e sem empenhar o seu peso político para convencer candidatos de primeira linha, estará a tornar tudo ainda mais complicado. A taxa de aprovação do Governo e a baixa popularidade de Passos também não ajuda nesta fase do campeonato.
Lisboa e Porto são exemplos acabados do estado da arte do PSD em relação às eleições locais. Na Invicta, o candidato contra o mediático e popular Rui Moreira (independente que agora tem o apoio do PS e do CDS) será o quase desconhecido Álvaro Almeida, ex-presidente da Entidade Reguladora da Saúde. Na capital, depois de meses à espera de Santana Lopes, o PSD terá de escolher um candidato de recurso, pois até para apoiar Assunção Cristas é demasiado tarde. Dentro do partido há o reconhecimento de que, apesar de poder melhorar a cifra de câmaras, dificilmente o PSD conquistará uma capital de distrito ou uma das cinco grandes autarquias do país.
... pela herança do seu próprio Governo
Os últimos casos fazem manchete nos jornais de hoje: “Passos entrega à pressa diamantes a Angola”, intitula o Correio da Manhã, enquanto o Público volta ao folhetim Caixa Geral de Depósitos para revelar que “Governo Passos congelou alertas das Finanças até perto das eleições”. Passos não se livra do passado – e não é só daquele de que ele próprio faz questão de não se livrar.
O facto de ter feito questão em manter por perto (como sua vice-presidente) Maria Luís Albuquerque não ajuda, tantas são as vezes em que decisões da ex-ministra das Finanças (no BES, no BANIF, na CGD, nas contas públicas) continuam a ser postas em causa pelo Governo (ou pelos seus parceiros parlamentares). Isto para não falar na polémica gerada, logo no início do ano, por ter aceitado ser administradora não-executiva da Arrow Global, uma empresa anglo-saxónica especializada na angariação e recuperação de dívida pública e privada e de análise de risco. A comissão parlamentar de Ética haveria de concluir pela inexistência de incompatibilidades mas mesmo dentro do PSD as críticas foram mais que muitas.
… por Marcelo Rebelo de Sousa
Como lembrou este domingo Marques Mendes, Passos e Marcelo não têm sido os melhores amigos nos últimos anos e isso... vem-se notando cada vez com maior nitidez. Passos por mais do que uma vez mandou representantes a reuniões formais em Belém e apesar de, depois disso, já terem tido uma longa conversa a sós, no PSD é bem evidente o desconforto sentido pelo facto de o PR se entender tão bem com António Costa. Na semana passada, o líder do PSD não resistiu a desabafar: “Ainda bem que ele não é o presidente do PSD”. E Marcelo respondeu-lhe à letra, garantindo que o chefe de Estado não pode ter “preferências” nem “amuos”.
… pelo sucessor de Marcelo Rebelo de Sousa
Luís Marques Mendes, que ficou com o exclusivo do comentário televisivo no prime time de domingo, depois da saída de Marcelo da TVI, tem sido um dos críticos mais duros em relação a Passos Coelho. Este domingo voltou a ser assim, por causa do bate-boca entre o líder do PSD e o Presidente da República na semana passada: “Marcelo é uma referência de popularidade, de prestígio, de estatuto, de autoridade. Passos Coelho, numa guerra com o Presidente, perde sempre, como qualquer líder de oposição perderia. É uma espécie de auto golo”, disse o comentador, na SIC. As críticas de Mendes ao ex-PM no seu espaço de comentário são recorrentes.
… pelas sondagens
São todas más para o PSD. Na mesma medida, são todas boas para o PS. António Costa sobe nas sondagens e o PS também, Passos Coelho desde e o PSD idem. Os socialistas aproximam-se do limiar da maioria absoluta, sem necessidade dos seus parceiros de “geringonça”, ao mesmo tempo que o PSD nem colado ao CDS consegue disputar a vitória. E, por todos os pontos anteriores, nada indica que esta tendência esteja à beira de se inverter.
Resta a Passos Coelho fazer o que tem feito: andar pelas estruturas do partido, pedindo à sua gente que tenha paciência e não ande “ao sabor da maré”. O ex-PM pede ao PSD que ganhe “carapaça” e tenha a mesma capacidade de resistência que ele próprio tem demonstrado. Que Passos é resiliente, já se sabe. Resta saber se o partido mostra a mesma característica ou se é pragmático, como costumam ser os partidos de poder: nesse caso, quando o PSD achar que Passos deu o que tinha a dar, agradece-lhe os serviços e parte para outra.
... e pelo CDS, ex-parceiro de coligação
Ao contrário de Passos, Portas não quis ficar, uma vez empossado o Governo de António Costa, e deixou a Assunção Cristas a tarefa difícil de capitanear o partido agora “órfão” do seu líder carismático de vinte anos. A líder centrista não se deixou acabrunhar e tem insistido em trilhar o caminho da autonomia dos ex-parceiros de coligação, com os olhos postos no eleitorado mais moderado do centro-direita. E conseguiu mesmo levar a dianteira nalgumas matérias (como a proposta de levar a votos o Programa de Estabilidade, que acabou apoiada pelo PSD; ou, mais emblemático, o anúncio da sua própria candidatura à presidência da Câmara de Lisboa).